Os drones chegaram, não tem como negar isso. Este aparenta ser um caminho sem volta. Já faz tempo que eles são utilizados para fotos e gravar filmes, novelas ou suas férias, além de pulverizar lavouras, combater o coronavírus. Algumas aeronaves são modelos simples, com objetivo de ser apenas um brinquedo. Você pode não gostar, mas alguns deles já estão em testes para entregar comida, enquanto outros prometem tomar o lugar dos táxis.
Com tantas opções no mercado, uns competentes e outros nem tanto, regras precisam aparecer para evitar problemas. Desde a privacidade quando uma câmera te vê lá de cima, indo até o problema que uma aeronave destas pode causar nas proximidades de um aeroporto, heliponto ou qualquer rota aeronáutica.
Antes de começar a falar sobre as regras e regulamentações, é preciso ter em mente o que realmente é um drone. Todos eles são controlados remotamente ou voam de forma autônoma, e o maior número dos existentes são divididos em duas categorias: asa fixa e asa rotativa.
Asa fixa é o equivalente ao avião, enquanto asa rotativa é mais próximo de um helicóptero. Drones de asa fixa geralmente voam mais rápido, por mais tempo e percorrem áreas maiores, enquanto os de asa rotativa ganham manobrabilidade e podem voar tranquilamente dentro de ambientes confinados – como a sua sala.
O drone que você deve estar pensando neste exato momento é de asa rotativa, uma aeronave com quatro hélices e que fica pairando no ar. Eles são os mais populares, baratos e simples na hora de pilotar. São esses que querem levar o nhoque em alguma parte da rota até sua casa, ou então patrulhar sua casa na busca por intrusos.
Quem controla o voo dos drones no Brasil é a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), junto da Anatel (Agência nacional de telecomunicações) e o DECEA (Departamento de controle do espaço aéreo), com algumas regras e regulamentações bem claras. Para a Anac existem dois objetivos para as aeronaves: o primeiro é o uso para recreação e lazer, enquanto o segundo foca em fins comerciais, experimentais ou institucionais. Em números o Brasil já conta com 78.304 drones registrados até setembro de 2020, sendo 61,1% deles considerados para uso recreativo.
Independente do objetivo do drone, existem três categorias no Brasil:
Dentro desta Classe 3 existem duas divisões, sendo a primeira para drones com peso máximo de decolagem de até 250 gramas e a segunda para os que passam disso.
A ANAC considera peso máximo de decolagem para a soma dos pesos das baterias (ou combustível), cartão de memória, câmera, sensores, motores, hélices e até mesmo o peso da eventual carga que pode estar lá. Este valor não leva em consideração o peso do momento da decolagem e este é um ponto polêmico com o DJI Mavic Mini, que tem 249 gramas, mas oficialmente pode carregar aproximadamente 272 gramas. O peso extra está na proteção para as hélices e entra na parte de “eventual carga”.
A agência exige registro de todas as aeronaves ou drones de uso recreativo ou não, que possuam peso máximo de decolagem superior aos 250 gramas e que voam dentro do campo de visão do operador, abaixo de 120 metros de altitude. O registro precisa dos dados pessoais de quem vai operar os drones, junto dos dados da aeronave (nome, modelo, fabricante, número de série e foto).
O registro é como a matrícula de uma aeronave no avião ou helicóptero. É com ela que algum tipo de reparação pode acontecer sem grandes dificuldades. Ao Tecnoblog, Mario Saadi, sócio de Infraestrutura do Tauil & Chequer Advogados diz que é importante a “homologação desses drones junto da própria agência, para que ela possa ter de antemão algum tipo de controle sobre quem está operando aquela aeronave não tripulada, onde que ela está sendo operada e qual aeronave é”.
Este registro ajuda até mesmo quando o seguro precisa ser acionado.
A maior parte dos drones para pessoas que querem apenas filmar as férias, ver se o telhado está inteiro ou conhecer o bairro pelo céu, são de Classe 3 na variante entre 250 gramas e 25 quilos (como o Mavic Mini, Mavic Pro, Phantom 3, Phantom 4, Mavic Air, junto de quase todos os outros drones focados em uso recreativo da DJI e seus concorrentes). As regras para pilotar são:
É possível trocar de piloto durante a operação, mas é necessário manter os comprovantes do seguro, da avaliação de risco e o manual de voo no mesmo local. Para drones de Classe 1 é necessário adicionar a habilitação para operar o drone, certificado médico aeronáutico, certificado de aeronavegabilidade e ter o comprovante da inspeção anual de manutenção. Para Classe 2 basta remover o comprovante da inspeção anual de manutenção.
O Decea também orienta que voos até 131 pés de altura, ou aproximadamente 40 metros, não podem acontecer em distância inferior a 5,4 quilômetros de um aeródromo ou aeroporto. Para voar com drone entre 40 e 120 metros de altura, a distância de aeródromos é de nove quilômetros.
Para drones com peso máximo de decolagem marcado em até 250 gramas, a única regra é para o piloto ter mais de 18 anos.
No trânsito existem regras que vão além do Código de Trânsito Brasileiro, e isso também acontece dentro da operação de drones no Brasil. Algumas possibilidades de problemas existentes estão na privacidade de pessoas que estão no caminho dos drones, como quando eles sobrevoam áreas urbanas e locais públicos.
“O código penal tenta lidar com condutas futuras, como matar alguém e que acarreta em pena de seis até 30 anos de reclusão. A mesma coisa, em boa medida, aplica-se a atividade ou a operação de drones em geral”, comenta Mario Saadi.
“Um drone vai a alturas altíssimas e, por hipótese, eles podem ser manejados em qualquer lugar, inclusive em aeródromos civis. O drone pode interferir no plano de voo e causar alguma atividade mais grave. A operação dentro dessas áreas pode ser sancionada pela Anac (…) quando um voo está sendo realizado. A responsabilização pode ser civil, administrativa ou penal”, diz o advogado.
Neste cenário, caso a aeronave seja capturada pela própria Infraero ou qualquer outro órgão de segurança, o voo irregular pode resultar em ação pecuniária com multa, indo até a interdição da empresa quando a operação do drone era para fins comerciais – como uma filmagem de propaganda.
Recentemente, um drone que sobrevoava as proximidades do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, causou a interrupção de toda a operação dos aviões. Neste caso, adiciona-se a possibilidade de ação civil por consequência dos danos financeiros das companhias aéreas e da própria Infraero – já que se o voo é cancelado ou desviado pelo fechamento do aeroporto, a empresa tem problemas com as passagens.
A ação é aplicável tanto para a conduta irregular de uma pessoa jurídica ou física, já que o dano é o mesmo e isso vale até para um drone de brinquedo.
Outro ponto importante é o de privacidade e segurança de pessoas. Mesmo que respeitada a regra de sobrevoo acima de 30 metros de altura, quem controla o drone precisa da anuência das pessoas filmadas ou fotografadas. Este detalhe é necessário tanto em capturas para uso próprio, como para registro de imagens para divulgação posterior – comercial ou não.
Caso uma denúncia ocorra, a investigação do drone e operador responsáveis acontece de forma semelhante ao caso do aeroporto. As penalidades também, somando as possíveis regras não respeitadas da Anac com uma ação civil ou criminal.
Em outros países já existem testes de entrega de encomendas com drones, já no Brasil a mais recente é o caso do iFood. A empresa brasileira está com teste marcado para novembro de 2020; ela vai retirar um pacote com alimentação do Shopping Iguatemi em Campinas (SP), para levar até um ponto de pouso como um heliponto, onde a entrega prossegue com outro meio.
Neste caso o drone é maior. O modelo escolhido pela empresa operadora, a Speedbird, é o DLV-1 Albiventer, com 1,2 metro de diâmetro, peso de aproximadamente 10 kg e capacidade de carga de até cinco quilos – mas o iFood limitou em dois quilos. Fernando Martins, head de Logística, Inovação e Engajamento do iFood, diz ao Tecnoblog que a escolha do modelo aconteceu após estudos de outras entregas semelhantes que acontecem em outros locais.
No caso tupiniquim, a tecnologia é muito semelhante e a decisão de levar apenas comida está justamente na capacidade de carga, já que compras de mercado costumam ter peso maior. Diferente de drones recreativos, o DLV-1 Albiventer é operado com rotas previamente traçadas, autorizadas pela Anac, que são percorridas de forma quase autônoma.
“O voo é considerado automatizado. Ele tem toda tecnologia suficiente para decolar e pousar do ponto A ao ponto B, mas ele tem um piloto profissional para intervir no voo, caso necessário”, comenta Fernando.
Para este teste foi emitido um Certificado de Autorização de Voo Experimental pela Anac, com duração de até um ano. Todo o trajeto aprovado não sobrevoa outras pessoas e nenhuma via de alto fluxo, respeitando os 30 metros de altura. “Dando tudo certo, como previsibilidade de entrega e como ele (o drone) soma aos outros modais (…), os testes podem acontecer futuramente em até outras 200 cidades onde o iFood já opera”, explica o executivo.
Fernando também acredita que o certificado para este primeiro teste pode facilitar as próximas regulamentações sobre os drones comerciais, em entregas.
Depois das entregas, outra aplicação com resultados positivos para toda a regulamentação é a pulverização de lavouras. “As regras vêm evoluindo e o mercado tem sido escutado. São vários canais abertos entre os usuários e os reguladores, entendendo as demandas e explicando a necessidade das regras para o convívio das aeronaves não tripuladas com as tripuladas”, diz Eduardo Goerl, CEO e fundador da startup ARPAC.
Foram estes tipos de drones, maiores e mais robustos, os escolhidos para ajudar no combate ao COVID-19 no Brasil. No campo eles coletam imagens do lavrado, aplicam insumos e até liberam predadores como Cotésia e Trichogramma, com objetivo de aumentar a produtividade da plantação.
Eduardo também afirma ao Tecnoblog que a regulamentação brasileira é muito semelhante ao que existe internacionalmente, já que “o Brasil segue regras propostas pela OACI (Organização da Aviação Civil Internacional). podendo apresentar regras individuais mais restritivas”.
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