Você tem o costume de catalogar suas leituras? Existem sites voltados para isso, mas que ainda vão além e funcionam como redes sociais para leitores. É o caso do Goodreads, criado em 2006 e comprado pela Amazon em 2013. No Brasil, também temos o Skoob, plataforma brasileira lançada em 2009. Mais do que um espaço para trocar percepções sobre livros, esses sites também podem ser um local para autores expandirem a presença digital e se comunicarem com pessoas apaixonadas por leitura, saindo um pouco das redes sociais tradicionais como Instagram e Twitter.
Hoje, em junho de 2021, o Goodreads tem mais de 125 milhões de usuários globais. Todos os meses, 30 milhões de livros são marcados como “Quero ler” por pessoas na rede. Apesar da plataforma não divulgar números referentes ao público brasileiro e não ter uma versão em português, parece estar crescendo por aqui.
A diretora de Marketing sênior do Goodreads, Mimi Chan, afirma ao Tecnoblog que “os autores devem estar no Goodreads porque ele é o lugar que as pessoas vão quando querem descobrir livros, falar sobre o que elas estão lendo e catalogar as leituras”. Em suma, a rede ajuda os autores a atingirem os leitores no momento certo, quando eles estão focados em livros.
A descoberta de livros está no cerne do Goodreads. Nossos membros também adoram ajudar outros leitores a decidir se um livro é certo para eles. Temos mais de 125 milhões de resenhas de texto no Goodreads e centenas de milhões de avaliações. Tudo isso faz do Goodreads uma fonte confiável para aprender mais sobre um livro.
Mimi Chan, diretora de Marketing do Goodreads
Pensando nessa integração entre leitor e escritor, o Goodreads criou o Author Program. Quando um escritor se inscreve neste programa, passa a ter o selo de autor do Goodreads no perfil, como você pode ver na imagem abaixo.
Isso é relevante principalmente porque a página do autor no Goodreads também é vinculada ao perfil dele como leitor. Além das publicações relacionadas às obras originais, quem segue um autor consegue ver o que ele está lendo, quer ler ou já leu, avaliações que ele escreveu, quotes preferidos e quais notas deu para os livros lidos. É uma forma de encorajar que os escritores estejam presentes na plataforma das duas maneiras e possam alimentar o público com variadas informações, sejam elas sobre os títulos publicados, tipo de leitura que preferem como leitores ou quais referências consomem.
Para a escritora e booktuber Bel Rodrigues, autora de 13 Segundos, essa possibilidade de interação com os membros é um grande atrativo:
Marcar as leituras que estou fazendo e avaliá-las posteriormente é muito legal. Como é uma rede social voltada para os leitores, é como se estivéssemos mais próximos, lendo juntos mesmo. Gosto muito quando eles interagem com alguma resenha ou post feito por mim, é sempre um incentivo a mais para trazer ainda mais gente para a plataforma.
Segundo o Goodreads, hoje o Author Program conta com 340 mil autores cadastrados. Além das funcionalidades comuns a todos os usuários, também existem benefícios para quem faz parte do programa, como um espaço para blog, organizar sorteios e abrir perguntas para os leitores com a seção Ask The Author (Pergunte ao Autor).
O site tem diferentes iniciativas que estimulam a descoberta de novos livros, como newsletters enviadas por e-mail, entrevistas com autores, prêmios de melhores livros do ano e listas de recomendações variadas. Estes artigos com recomendações, em especial, são curiosos porque muitas vezes nascem de insights gerados a partir de dados dos usuários. “Nossas newsletters são criadas por nossa equipe editorial. Os livros incluídos em nosso conteúdo editorial são selecionados com base em dados que identificam os livros que geram mais interesse e boas avaliações de nossos membros”, confirma Mimi.
A lista Readers Most Anticipated Books of June (Os livros mais esperados pelos leitores no mês de junho), por exemplo, enumera as publicações que mais foram marcadas como “Quero Ler” pelos membros da plataforma. Mas também há curadorias mais pitorescas, como Armchair Traveling: Books Set in Every U.S. State (Livros que se passam em cada um dos estados dos Estados Unidos) ou 32 Historical Romance Series to Binge-Read after ‘Bridgerton’ (32 séries de romances históricos para você ler compulsivamente após ver Bridgerton).
No entanto, por ser uma plataforma originalmente americana, é natural que os livros publicados em inglês ou com tradução para o idioma tenham mais destaque no Goodreads. O escritor brasileiro Lucas Rocha, autor de Você Tem A Vida Inteira, pontua:
É um mercado consumidor de livros muito maior, acho que faz até sentido ter mais usuários e resenhas em inglês do que em português. Não só pelo Goodreads ser uma plataforma originalmente dos EUA, mas também por lá ter uma tiragem inicial que é o dobro ou triplo de uma tiragem para autores iniciantes aqui no Brasil.
Lucas também teve o livro publicado pela editora americana Scholastic em 2020 – em inglês, o título se tornou Where We Go From Here. Ele foi convidado para falar ao Goodreads sobre a história no artigo Meet the Authors of June’s Popular Queer Young Adult Fiction (Conheça os autores dos livros de ficção queer para jovens adultos mais populares em junho), publicado ainda em 2020.
Na editora americana, existe a figura do publicist, que aqui a gente não tem muito. É uma pessoa encarregada de cuidar da parte de divulgação na mídia. Então foi ela quem entrou contato com eles – ou eles entraram em contato com ela, não sei exatamente como é o trâmite –, e me disse que o Goodreads queria fazer uma entrevista comigo.
Fica claro que os autores americanos conseguem usufruir bem das ferramentas oferecidas pelo Goodreads. Apesar de não ter atividades como leitora na rede, Casey McQuiston, que escreveu Red, White & Royal Blue, best-seller do New York Times, tem um perfil bem forte na plataforma. Ao entrar na página, você vê todos os conteúdos que tiveram menção à escritora e aos seus livros – muitos artigos e recomendações pelo Goodreads, além das respostas aos fãs na seção Ask the Author.
O Author Program é gratuito e disponível para usuários de todos países, o que na teoria parece incrível. Na prática, apesar de muitos autores brasileiros se inscreverem na iniciativa, existe uma sensação de que mais coisas poderiam estar sendo feitas por ali. Para Iris Figueiredo, autora do livro Céu sem Estrelas, a plataforma peca por não ter uma versão em português:
Gostaria de ver essa rede traduzida. Pra mim, a maior dificuldade enquanto escritora é que, como a rede é em inglês e tem muitas funções os leitores não conhecem, é uma linguagem que quem não fala ou lê em inglês costumeiramente não consegue acessar. Eles não vão entender, não é aquela linguagem tradicional de rede social. Existem algumas palavrinhas a mais que, se você não tem domínio da língua, acaba não entendendo, então isso afasta alguns leitores brasileiros, por ela não ser traduzida.
Lucas costuma usar a rede como espaço para curadoria, além de um indicativo para entender os gostos do público:
Eu gosto de saber o que as pessoas estão lendo e se interessando, acho que é uma forma muito legal de você usar o Goodreads como autor, saber o que as pessoas estão falando, quais são os livros que estão sendo mais debatidos, tentar entender o motivo deles estarem sendo mais debatidos. A partir daí, você entra numa outra criação. Além disso, funciona principalmente pra eu entender qual é o impacto que o meu livro tem nos leitores. Ele e o Skoob são termômetros para entender se o livro está bem recebido ou não, se está bem falado ou não, se ele tem problemas ou não.
Iris, por outro lado, foca na interação: “Geralmente gero conteúdo geralmente. Já cadastrei citação do meu livro quando podia, atualizo meu perfil de tempos em tempos, as minhas leituras eu tento mostrar bastante pros meus leitores – ‘Isso aqui é algo que eu curti bastante, me lembrou minha própria escrita’, coisas desse tipo”.
Apesar de haver um espaço para réplicas em resenhas – o que pode ser tentador para responder uma avaliação negativa, por exemplo –, muitos autores preferem fazer da página de seus livros no Goodreads um espaço exclusivo para os leitores. “Claro que você pode conversar com os membros e construir uma comunidade lá, mas em última análise é um espaço de leitura e leitores, não é pro escritor querer debater o que você achou do livro dele”, opina Lucas.
Em alguns casos, os autores preferem até evitar olhar a maioria das resenhas. É o que acontece com a Iris:
Tenho pavor de ler resenha em qualquer lugar. Não leio a resenha de nada nunca, só leio se me marcarem, pedirem. Acho muito que a página do livro (nas plataformas) não é mais minha, ela é um espaço pro leitor. Já vi autores fazerem isso, tanto no Goodreads como no Skoob, e eu não acho legal porque acho que você acaba inibindo outros leitores. Leitores que podem gostar ou que podem odiar. Ir lá, rebater, comentar resenha não é algo que eu acho interessante. Quando vejo um autor fazendo isso na página de um livro, me sinto mais constrangida de opinar sobre o que achei, e às vezes tira até meu ânimo de ler a história.
“Se me perguntarem quantos leram, não sei. Não sei a posição do meu livro no ranking da Amazon, só se alguém me dizer. Não faço ideia de quantas avaliações tem no Skoob, na Amazon, qual a média de estrelas dele no Goodreads. Porque acho que é um espaço muito do leitor, de um leitor conversando com outro. Se ele quiser que eu saiba o que ele achou do livro, ele vai me escrever diretamente”, completa.
Bel diz lia as avaliações após a publicação do livro, mas que isso mudou, principalmente pela forma como alguns leitores escolhem escrever a crítica:
Lia nos primeiros meses. Desde então, prefiro ler o que chega até mim ou buscar a leitura de resenha dos meus livros apenas quando preciso de respostas em relação a alguma história atual minha. Diversas críticas eu abracei e trabalhei para melhorar, mas é absurda a quantidade de ódio que as pessoas fazem questão de destilar quando estão atrás de um computador ou celular. Mas é algo que criadores de conteúdo, em geral, já estão acostumados, infelizmente.
Apesar de não entrar em discussões ou comentar na página do livro, Lucas conta que costuma olhar as reviews:
Eu olho sim as resenhas, assim que o livro foi lançado fica uma coisa meio obsessiva, eu entrava lá todo dia, às vezes mais de uma vez por dia pra ver se alguém tinha deixado uma resenha nova. Mas como esse livro (Você Tem a Vida Inteira) saiu em 2018, ele já tá há mais tempo no mercado, agora eu entro uma vez por mês pra ver o que o pessoal fala, pra ver a nota.. porque é uma coisa que ao mesmo tempo que eu sei da importância do ranqueamento por estrelas (o Goodreads ranqueia os livros entre 0 a 5 estrelas), também tenho um pouco de conflito com isso. Já me deixei impactar muito por resenha negativa.
Ainda sobre as críticas, ele conclui:
A primeira resenha negativa eu acho que é mais impactante. Você começa a colocar todo seu processo de autossabotagem em jogo e falar “esse cara realmente não tá certo, esse livro não tá bom”, não importa quantas resenhas você já teve antes ou depois. Com o tempo a gente aprende a filtrar o que precisamos ou não entender sobre aquilo. Algumas críticas são muito válidas e servem pro nosso futuro, mas outras coisas são pura questão de gosto pessoal. ‘Ah, eu não gostei da forma como ele escreve’ – é a forma que eu escrevo, não tenho como mudar isso no livro que já tá pronto, mas posso pensar nisso mais pra frente. É uma crítica que acho que não me afeta pessoalmente, porque é uma coisa que outras pessoas falam diferente, se fosse uma unanimidade eu acho que me afetaria mais.
Perguntei aos autores entrevistados para esta matéria se eles também tinham o costume de usar o Skoob, a rede social brasileira focada em leituras. Eles têm perfis lá, mas são mais ativos no Goodreads – em um primeiro momento, isso aconteceu porque o Goodreads tinha mais funcionalidades ou melhor desenvolvimento, e depois porque se habituaram à plataforma.
Talvez, um bom caminho para atrair ainda mais usuários e reconquistar membros antigos seria seguir essa veia de conteúdo exclusivo. “Gostaria muito que o Skoob tivesse isso no Brasil. Como autora, adoraria que o espaço na rede pro autor fosse mais interativo. Sinto falta de poder usar algumas ferramentas que os autores estrangeiros colocam no Goodreads. Ser uma rede social onde eu possa gerar conteúdo. Seria bom pra mim, pros leitores, pra rede social”, afirma Iris.
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