Foi-se o tempo em que casa inteligente era sinônimo de luxo, sofisticação e coisa de filme de ficção científica. Embora pareça estar caminhando a passos lentos, focando apenas em gadgets como lâmpadas e smart speakers, o conceito de smart home vem movimentando a economia e despertando o interesse de muita gente, no Brasil e no resto do mundo.
Atento à tendência nos Estados Unidos, onde, em 2017, 18% das residências já eram automatizadas, como revelou a Aureside (Associação Brasileira de Automação Residencial e Predial), o influenciador Gabe Simas, 32, não quis perder tempo e começou a deixar sua casa mais esperta. A experiência foi tão positiva que, hoje, o objetivo dele é desenvolver uma residência smart do zero, outra tendência entre as construtoras.
Em conversa com o Tecnoblog, Gabe diz ser um entusiasta da tecnologia. A curiosidade, principal motivador de muitos consumidores, fez o jovem apostar no conceito. Ele começou com as lâmpadas Philips Hue e controle por voz com o Google Assistente, há cerca de seis anos, quando 92% dos brasileiros já sabiam o que era casa inteligente e quase 60% acreditavam que essa tendência impactaria suas vidas no futuro, revelou um levantamento do GfK.
Eu sempre achei tudo muito mágico. Quando eu comecei a entender que não era um bicho de sete cabeças, que era algo viável, bastava uma tomada, o Wi-Fi, uma lâmpada e o celular, eu comecei a pensar: vamos ver o que dentro da minha casa, da minha realidade no Brasil, eu consigo fazer. Eu fui encontrando maneiras de deixar a casa mais legal [, mas] todo mundo fala “não poupa o tempo, você pode ir lá e acender uma luz”. Mas é além disso, [é] o poder de você controlar pela voz, de [definir] rotinas. Todo dia, 6 da tarde, ou quando o sol se põe, às vezes eu mudo essa programação, as luzes da minha sala se acendem com uma cor do pôr do sol, a luz da escada se acende mais forte para iluminar o caminho para a cozinha, a minha câmera, quando estou em casa, desliga, quando eu saio, ela liga automaticamente.
Gabe Simas, influenciador digital.
Especialistas ouvidos pelo Tecnoblog explicam que muitas pessoas começam com produtos acessíveis e dividir a experiência de uso com conhecidos próximos tem impulsionado a adesão desses equipamentos no país. José Roberto Muratori, diretor-executivo da Aureside, elenca alguns motivos que ainda impedem a adoção mais ampla da smart home no Brasil hoje.
A usabilidade é a principal barreira atualmente; depois vem a ideia de custo elevado que, na visão dele, é um mito, já que muitas empresas nacionais e internacionais entraram nesse mercado nos últimos anos e conseguiram desenvolver dispositivos com custo-benefício atraente, a exemplo da Positivo que começou no mercado com lâmpadas e, atualmente, vem se destacando no setor.
O custo, na verdade, vem caindo, mas existe um mito, as pessoas ainda acham que casa inteligente é algo caro, fora da sua possibilidade… E esse mito está sendo diminuído […], mas é um dos maiores obstáculos. Primeiro vem a usabilidade: ‘será que eu vou saber usar?’, ‘será que eu preciso, realmente?’. Quando [a pessoa] compra uma roupa, ela já adquiriu outra anteriormente […], quando [o cliente] vai adquirir uma [outra peça], ele já tem a experiência e quer melhorar ou repetir. Na automação, não, as pessoas não têm essa vivência, isso dificulta muito, porque vai ser uma coisa nova e você entra naquela curva de aceitação da tecnologia.
José Roberto Muratori, diretor-executivo da Aureside.
Em 2019 e no começo de 2020, a gente teve uma boa adoção, mas foi muito focada naquela […] pessoa que é aficionada pela tecnologia, que está a fim de comprar, testar e ver se funciona […] O conceito começou a entrar no Brasil pelos [entusiastas], mas ficou restrito para esse pessoal […]. Quando começou a pandemia, nós sentimos o impacto a princípio negativo […], teve um hiato muito grande que a gente consegue medir tanto em nível de vendas quanto em números de ativação. Passadas as quatro primeiras semanas, […] o consumidor brasileiro percebeu essa jornada de trabalhar e passar mais tempo em casa, e por conta disso, nosso ecossistema todo tem que ser mais sustentável, confortável […], aí a adoção cresceu e muito rápido.
José Ricardo Tobias, head da Positivo Casa Inteligente
Eu comecei com as lâmpadas e com o controle por voz, e usava muito para pedir música, uma informação do trânsito, hoje em dia eu já peço para ler a minha agenda assim que acordo, [ouço] as principais notícias do dia… A tecnologia já me ajuda nisso, eu não preciso pegar o celular para entender como vai ser o meu dia.
Gabe Simas, influenciador digital.
Dados da Strategy Analytics revelam que, globalmente, os alto-falantes inteligentes chegaram a muitos lares durante a pandemia. Empresas como Amazon e Google, com produtos relativamente baratos, estão surfando tranquilamente nesse boom. Um estudo divulgado pelo Business Wire mostra que 30 milhões de smart speakes foram vendidos durante o segundo trimestre de 2020.
No Brasil, as lâmpadas inteligentes têm chegado depressa aos lares. A Positivo Casa Inteligente é líder de vendas no setor com a sua Smart Lâmpada Wi-Fi e, junto de outros produtos que pertencem à divisão, a companhia viu os seus lucros crescerem. O Tecnoblog checou que a curitibana obteve um faturamento de R$ 12,3 milhões na divisão de smart home só no 3º trimestre de 2020, um crescimento de 271% em relação ao mesmo período do ano anterior. Durante o Amazon Prime Day, um evento anual de ofertas da gigante do e-commerce, a Positivo vendeu 45 mil lâmpadas.
A gente acredita que, além da lâmpada, o conceito de iluminação inteligente tem pegado o brasileiro. E ele tem gostado da ‘brincadeira’, tem se interessado e visto valor nesse benefício. A gente acredita que a iluminação inteligente vai ser um grande driver da categoria em 2021. E [com isso], as outras vertentes do casa inteligente acabam vindo junto.
José Ricardo Tobias, head da Positivo Casa Inteligente
Com a popularização da tecnologia, agora são as construtoras que querem aproveitar o auge da Internet das Coisas (IoT) com projetos residenciais inteligentes. A boa notícia é que a inovação tem chegado a outros segmentos, deixando de ser uma exclusividade de empreendimentos luxuosos.
A Trend Investimentos, uma incorporadora baseada em Porto Alegre, foi além e desenvolveu um empreendimento com o conceito HTML que, nesse caso, significa High Tech Millennial Lifestyle. A experiência tecnológica começa na apresentação do decorado por realidade virtual e termina ao entregar o condomínio integrado e sustentável. Para o CEO, o objetivo é automatizar a vida de quem está lá dentro.
A gente fez algumas adaptações no empreendimento, desde a parte de construção física, sendo o primeiro residencial em aço de Porto Alegre no milênio, até a questão de fachada, que é autolimpante […], a medida que o tempo passa, você não precisa pintar ela, apenas limpar com água e sabão e está renovada.
Rafael Severo, CEO da Trend Investimentos
Com cafeteria e espaço coworking, que pode ser alugado tanto por moradores quanto por pessoas externas, o Studio Trend conta com um aplicativo dedicado para agilizar esse e outros processos internos, além de reduzir custos.
A vida do empreendimento, quando ele estiver em uso, converge para o aplicativo, enquanto gestão […]. A ideia é facilitar o acesso dos usuários para que eles não tenham que recorrer a síndico etc. Ele [o morador/investidor] entra no app, vê a disponibilidade [de áreas do condomínio], agenda o que ele quer utilizar e segue a vida normal […].
Rafael Severo, CEO da Trend Investimentos
Em Campinas (SP), a construtora MRV lançou o seu primeiro residencial automatizado. Em parceria com a Positivo, a empresa afirma ter equipado os apartamentos com assistente de voz, além de interruptor smart na sala e nos quartos, fechadura inteligente e um controle universal capaz de comandar a TV, o home theater, o ar-condicionado e a TV a cabo.
Embora as construtoras estejam adotando a automação residencial, o consumidor precisa ficar atento às promessas que podem não ser cumpridas. Nessa circunstância, o projeto de automação residencial pode ficar nas mãos da administradora do condomínio ou até mesmo com o morador.
A construção civil é uma das áreas mais conservadoras no Brasil. As construtoras, no geral, estão pensando de duas formas: nas áreas comuns, existe uma procura por transformar essa parte automatizada, embora muito limitada. Muitas construtoras dizem que vão fazer, mas não fazem, infelizmente, ou se é feito o projeto, nem tudo é implementado. Depois fica na mão da gestão do condomínio. Por outro lado, nas unidades habitacionais, existem duas tendências: 1) não fazer nada e deixar por conta do morador; 2) e a outra de oferecer pacotes (ou kits) durante a construção.
José Roberto Muratori, diretor-executivo da Aureside.
O Brasil já deu um importante passo para popularizar o conceito de casa conectada. Já está em vigor, desde 1º de janeiro, a lei que concede benefícios para a Internet das Coisas pelos próximos cinco anos. Sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em dezembro passado, o projeto visa tornar a tecnologia mais em conta, trazendo novos investimentos para o país e a geração de mais de 10 milhões de empregos.
Entre outros benefícios, a nova Lei zera alguns tributos e, de acordo o Ministério das Comunicações, o objetivo é fazer com que o Brasil “seja uma das grandes potências globais no mercado de Internet das Coisas”.
Para 2021, existe uma expectativa de crescimento global de 14%. Dados do Statista mostram que existem 221,7 milhões de casas inteligentes; esse número deve subir para 258,7 milhões até o final deste ano.
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