Durante a sessão, também foram aprovados seis requerimentos, com convites a especialistas no assunto
SÃO PAULO – O relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata do pagamento dos precatórios previstos para o ano que vem, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), apresentou, na última segunda-feira (27), o plano de trabalho da comissão especial que analisa o mérito da matéria na Câmara dos Deputados.
O planejamento prevê a realização de audiências com quatro autoridades: 1) Representante do Ministério da Economia; 2) Representante do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz); 3) Representante da Confederação Nacional dos Municípios (CNM); e 4) Representante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A ideia do relator é realizar três audiências públicas por semana com os representantes citados e outros que venham a ser sugeridos e aprovados pelos demais integrantes da comissão especial. O colegiado é composto por 34 membros titulares e igual número de suplentes e corresponde à segunda etapa da tramitação da matéria, já aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da casa.
“Deveremos fazer visitas e reuniões de trabalho com o ministro da Economia, Paulo Guedes, e sua equipe; com o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux; e também com o ministro Bruno Dantas, representando o Tribunal de Contas da União, para que a gente possa andar o mais rapidamente possível”, afirmou Motta.
“Tudo isso visando ouvirmos essas autoridades, os atores que estão envolvidos nesse processo da PEC dos precatórios, para que a gente possa andar o mais rápido possível na elaboração desse relatório”, disse.
O prazo de dez sessões plenárias para que os congressistas apresentem emendas ao texto foi aberto em 23 de setembro. De lá para cá, já foram realizadas três sessões. Passado este prazo, o relator já está regimentalmente autorizado a apresentar seu parecer. Pela norma da casa, o processo pode levar até 40 sessões, mas todos os atores envolvidos têm demonstrado pressa em andar com a matéria.
“Este é um tema muito sensível. Estamos tratando de uma matéria que é inerente à vida de milhões de brasileiros, mas que não tenho dúvida que o trabalho desta comissão produzirá um resultado positivo, que reafirmará a credibilidade do governo federal e do nosso país no pagamento daquilo que é devido, mas sem esquecer encontrar uma saída para milhões de brasileiros que vivem dos programas sociais, do Bolsa Família, do futuro Auxílio Brasil, que são, sem dúvida nenhuma, o nosso principal objetivo a ser atingido no trabalho desta comissão e na posterior aprovação nos plenários da Câmara e do Senado Federal”, destacou o relator.
Durante a sessão, foram aprovados seis requerimentos, com convites a Rafael Fonteles, presidente do Comsefaz; ao juiz federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, especialista em precatórios; ao ministro Paulo Guedes (Economia); ao professor Guilherme Mello; ao professor Ricardo Carneiro; ao economista Guilherme Tinoco; a Bráulio Santiago Cerqueira, Presidente do Sindicato Nacional dos Auditores e Técnicos Federais de Finanças e Controle (Unacon Sindical); a Manoel Vitório da Silva Filho, Secretário da Fazenda da Bahia; Rafael Tajra Fonteles, Secretário da Fazenda do Piauí; Felipe Salto, Diretor Executivo da Instituição fiscal Independente; e a Tathiane Piscitelli.
Também foram aprovados convites a representantes da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
Na semana passada, o governo federal e o Congresso Nacional acertaram uma proposta para solucionar o pagamento de precatórios em 2022, em encaminhamento diverso ao do parcelamento originalmente proposto pela equipe econômica.
A saída, anunciada pelo ministro Paulo Guedes (Economia) e os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), estabelece um “subteto” para tais despesas – que no ano que vem seria de R$ 39,9 bilhões. O excedente passaria por um processo de negociação extrateto, ao passo que o montante em que não haveria acordo seria adiado para 2023.
A proposta de criação de um limite específico para o pagamento de precatórios, anualmente reajustado pela inflação acumulada (como as demais despesas sujeitas ao teto de gastos), vinha sendo costurada por meio de uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mas travou em meio à percepção de risco de insegurança jurídica.
Pelo entendimento, haveria até sete possibilidades de negociação das dívidas judiciais que seriam roladas para o ano seguinte (o que significa que poderiam ser pagos fora do teto de gastos, havendo consenso entre as partes):
-Quitação de débitos inscritos em dívida ativa do mesmo ente, inclusive em transação resolutiva de litígio – o chamado “encontro de contas”;
-Compra de imóveis públicos de propriedade do mesmo ente;
-Pagamento de outorga de delegações de serviços públicos e demais espécies de concessão negocial promovidas pelo mesmo ente;
-Aquisição, inclusive minoritária, de participação societária do respectivo ente federado;
-Compra de direitos do respectivo ente federado, inclusive, no caso da União, da antecipação de valores a serem recebidos a título do excedente em óleo em contratos de partilha de petróleo;
-Recebimento imediato do montante devido com desconto de 40%;
-Parcelamento em dez prestações, corrigidas pela Selic, sendo a primeira parcela de 15% do valor devido e as nove parcelas restantes em valores iguais.
A ideia é que todos os pagamentos feitos dentro dessas alternativas ocorram à margem do teto de gastos. Na prática, a medida permitiria a ampla negociação dos precatórios. Caso não haja acordo entre as partes, o pagamento será feito no Orçamento dos anos seguintes, respeitando a regra fiscal.
A PEC dos Precatórios foi encaminhada há mais de um mês pela equipe econômica ao Congresso Nacional e passou a ser uma das prioridades em termos de agenda legislativa do ministro Paulo Guedes. O texto é parte da estratégia para liberar recursos orçamentários no ano que vem e viabilizar a execução de políticas públicas.
Integrantes do governo argumentam que as despesas com precatórios deverão sofrer um crescimento real (ou seja, acima da inflação) de 102% de 2018 a 2022. As despesas sairiam, em um intervalo de 12 anos, do patamar de 11% de todos os gastos discricionários do governo para 90%. Ou seja, sobraria pouca margem de manobra para os gestores alocarem recursos.
Os gastos oriundos de sentenças judiciais estão estimados em R$ 89,1 bilhões no ano que vem, um salto de R$ 34,4 bilhões em relação a 2021 ‒ montante que consumiria quase toda a “sobra” projetada para o teto de gastos por conta do descasamento de indexadores inflacionários. O que levou Guedes a chamar as despesas de “meteoro” para as contas públicas.
Desde que foi informado sobre o montante projetado para 2022, o governo vem estudando alternativas para restringir o impacto da explosão dos precatórios sobre o orçamento público. É nesse contexto que surge a polêmica PEC 23/2021, que abre novas possibilidades de parcelamento dessas dívidas em que não é mais possível recorrer na Justiça.
A Constituição Federal já prevê situações específicas para o parcelamento dos precatórios. Tal possibilidade, no entanto, está condicionada a precatórios com valores superiores a 15% do montante de precatórios apresentados.
Neste caso, 15% do valor desses precatórios poderá ser pago até o final do exercício seguinte e o restante em parcelas iguais nos cinco exercícios subsequentes, acrescidas de juros de mora e correção monetária, ou mediante acordos diretos, com redução máxima de 40% do valor do crédito atualizado, “desde que em relação ao crédito não penda recurso ou defesa judicial e que sejam observados os requisitos definidos na regulamentação editada pelo ente federado”.
Mas integrantes da equipe econômica argumentam que as regras hoje são “inócuas”, já que enquadrariam apenas dois precatórios em 2022. Com a PEC, eles falam em “modernizar” o dispositivo criando regras adicionais para o parcelamento, reduzindo a pressão de tal despesa para a gestão orçamentária.
A proposta preserva as chamadas requisições de pequeno valor (RPVs), que sempre estariam fora do parcelamento e seriam pagos à vista de forma integral. Integram o grupo peças que não ultrapassem 60 salários mínimos (ou seja, R$ 66 mil).
Na outra ponta, os chamados “superprecatórios” poderiam ser pagos em dez parcelas, sendo 15% à vista e o restante em parcelas anuais. O montante seria corrigido pela taxa Selic (o que também provocou críticas, já que nem sempre o indicador cobre os impactos da inflação), hoje fixada em 5,25% ao ano. Integram este grupo peças com valor superior a 1.000 vezes 60 salários mínimos (ou seja, R$ 66 milhões).
O restante dos precatórios, localizados na faixa intermediária entre os de pequeno valor e os “superprecatórios”, estariam sujeitos a uma regra temporária, que irá até 2029. Neste caso, seria permitido o parcelamento quando a soma desses precatórios superar 2,6% da receita corrente líquida da União nos 12 meses anteriores à apresentação pelo Judiciário.
O texto também prevê a criação de um fundo de Liquidação de Passivos da União, cujos recursos poderão ser utilizados para pagamento da dívida pública federal interna e externa e o pagamento antecipado de precatórios parcelados.
Ao longo da tramitação da PEC será possível observar o que será preservado da proposta original do governo e em que medida os parlamentares exigirão alterações na nova solução costurada na última semana.
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